Costuma-se dizer que "fulano deu sorte". Que “estava no lugar certo, na hora certa”. Que a vida “sorriu pra ele”. É bonito, poético — e também uma enorme armadilha.
Porque o que muita gente chama de sorte, na verdade, é o encontro entre uma oportunidade e alguém preparado para aproveitá-la. Oportunidades passam o tempo todo — só que nem todo mundo está pronto. Nem todo mundo acordou cedo. Nem todo mundo estudou. Nem todo mundo estava se desenvolvendo. Nem todo mundo treinou o corpo, a mente e o espírito para aguentar a pancada do sucesso.
É por isso que a sorte só sorri para quem está acordado.
A oportunidade vai passar por você. A pergunta é: você vai estar pronto?
Você quer passar num concurso? Quer crescer na advocacia? Quer se tornar referência em alguma área? Ser convidado para aquele projeto? Ser visto? Ouvido? Reconhecido?
A pergunta certa não é “como eu consigo isso?”. É: "Se isso aparecer amanhã, eu dou conta?"
Imagine só: o seu nome entra no radar de alguém grande, aparece uma vaga num escritório, um professor te convida para escrever junto, ou surge um caso que pode mudar sua carreira. Se você não estudou o que devia, se não tem postura, se não se comunica bem, se não se posiciona, se vive no automático e não se prepara, você perde. A oportunidade bate e vai embora.
E sabe o que é mais cruel? Você talvez nem perceba que ela passou. Porque não é só sobre estar “visível”, é sobre estar pronto. Visibilidade sem preparo é só vitrine vazia.
O preparo é diário. É invisível. E é isso que incomoda.
A preparação é feita nas horas em que ninguém está olhando. É quando você levanta e estuda mesmo cansado. É quando você vai para a academia mesmo com preguiça. É quando você revisa aquela aula chata, escreve um texto que ninguém mandou, assume a bronca que ninguém quis.
E quando tudo dá certo — a resposta do mundo é sempre a mesma: “Você deu sorte”.
Não. Você não deu sorte. Você criou espaço para ela chegar. Você construiu a ponte que ligou você à oportunidade.
Mas as pessoas preferem acreditar que foi sorte, porque assim elas se isentam. Pensam: “Ah, eu não tive a mesma sorte”.
É mais fácil do que admitir que talvez elas não estavam se preparando para nada.
Sucesso é estrutura, não evento!
Quem cresce de verdade, cresce com base.
E base não se constrói com impulso. Se constrói com constância.
E constância exige compromisso com você, com seus sonhos e com a vida que você diz que quer viver.
Por isso, eu levanto todo dia e me preparo. Estudo, leio, escrevo, trabalho, treino, me visto bem, mesmo quando ninguém está olhando. Mesmo quando parece que nada está mudando.
Porque o meu compromisso não é com o agora. É com o que eu posso me tornar.
Se a sorte aparecer, eu quero estar pronto. Se não aparecer hoje, tudo bem. Estarei ainda mais pronto amanhã.
E quando ela vier (e ela vai vir), vão dizer que foi sorte.
E eu vou sorrir. Porque eles nunca entenderão que a sorte não explica nada. Ela só revela quem estava preparado.
A máxima “in dubio pro societate” tem ganhado popularidade em decisões judiciais e discursos públicos, especialmente em momentos decisivos como o julgamento da pronúncia no Tribunal do Júri ou em decisões que envolvem prisão preventiva e recursos em matéria penal.
Mas é preciso dizer com clareza: essa expressão não encontra base legal, doutrinária sólida ou respaldo constitucional no Brasil.
📌 O que significa, afinal?
Traduzido do latim, “in dubio pro societate” significa “na dúvida, a favor da sociedade”. Na prática, tem sido usada para justificar decisões que, mesmo diante da dúvida, optam por continuar o processo, manter a prisão ou mandar o acusado a júri. É vendida como um “contrapeso” à impunidade.
Mas esse raciocínio subverte os pilares do processo penal acusatório.
⚖️ O princípio da presunção de inocência
O ordenamento jurídico brasileiro adota expressamente o princípio da presunção de inocência (art. 5º, inciso LVII, da CF):
“Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória.”
Dessa premissa decorre outro princípio basilar: o “in dubio pro reo” — ou seja, na dúvida, decide-se a favor do acusado.
Essa garantia protege o indivíduo contra o poder punitivo do Estado, reconhecendo que a liberdade é a regra e a punição a exceção, condicionada à certeza da culpa após um processo justo e com ampla produção de provas.
❌ “In dubio pro societate” é o oposto disso
Adotar o “in dubio pro societate” significa inverter o ônus da prova, punindo sem certeza, tolerando a possibilidade de erro e relegando a liberdade a um valor secundário.
Mais do que juridicamente incorreta, essa prática é inconstitucional. Ignora o devido processo legal, a presunção de inocência e o próprio modelo de processo penal democrático.
🧠 O problema da pronúncia
Um dos principais espaços onde essa ideia se manifesta é no julgamento da pronúncia no Tribunal do Júri, onde se costuma dizer que, “na dúvida”, deve-se mandar o acusado a julgamento popular.
A jurisprudência consolidou a ideia de que, nessa fase, basta “indícios suficientes de autoria” — o que é legítimo dentro da sistemática do júri. O problema é quando essa baixa exigência de prova passa a ser confundida com a possibilidade de condenar com base na dúvida.
Mesmo no júri, o princípio da presunção de inocência permanece íntegro. O juiz togado pode mandar o caso a julgamento, mas os jurados devem absolver diante da dúvida.
🧨 Riscos de um processo penal punitivista
A retórica do “pro societate” cria um terreno fértil para o arbítrio: decisões baseadas em clamor público, seletividade penal e populismo punitivo.
O que se ignora é que a sociedade também se protege quando o processo penal respeita garantias.
O réu de hoje pode ser o cidadão comum de amanhã. A dúvida, tolerada hoje, pode se voltar contra qualquer um no futuro.
“In dubio pro societate” não é princípio. É discurso ideológico.
É uma tentativa de legitimar a punição sem prova suficiente.
É um retrocesso travestido de justiça.
Punir com base na dúvida não é proteger a sociedade — é ferir a Constituição e deslegitimar o processo penal.
Se a culpa não é certa, a resposta correta do Direito não é a punição, é a absolvição.
A recente condenação do comediante Léo Lins a mais de oito anos de prisão e multa pelo conteúdo de piadas em seu show “Perturbador” acendeu um alerta perigoso: o Brasil pode estar naturalizando a punição da comédia — uma das formas mais antigas e legítimas de crítica social.
Não se trata aqui de dizer que todas as piadas são boas, apropriadas ou engraçadas. Mas sim, reconhecer que a comédia é, por definição, uma arte exagerada, provocativa, que distorce a realidade para gerar impacto, riso e, muitas vezes, reflexão.
A comédia sempre foi perturbadora — e necessária
Na Grécia Antiga, Aristófanes já usava o riso como arma política. Em peças como As Nuvens ou Lisístrata, ele satirizava filósofos, militares e a guerra, colocando a comédia como linguagem de resistência.
Séculos depois, Molière, na França do século XVII, ironizava o moralismo e a hipocrisia burguesa com personagens como o falso devoto em O Tartufo. Era a crítica social travestida de riso — e não raro perseguida por isso.
No Brasil, gênios como Chico Anysio, Jô Soares e Ariano Suassuna entenderam e praticaram esse mesmo ofício: rir para expor, exagerar para revelar. Em Auto da Compadecida, por exemplo, a comédia é o pano de fundo para questionamentos morais, sociais e religiosos profundos.
Ou seja, o humor nunca foi sobre agradar — mas sim sobre tensionar. Ele não nasce da conveniência, mas do desconforto.
Piada é crime?
A questão que deveria ser feita não é “essa piada é boa?”, mas sim: existe dolo? Intenção de ofender alguém diretamente, fora do contexto cômico? No caso de Léo Lins, trata-se de um espetáculo artístico, com plateia pagante, com conteúdo anunciado e classificado como “humor negro” — ou seja, não há vítima direta, nem motivação discriminatória autônoma.
A criminalização nesse contexto é preocupante porque desconsidera o caráter da comédia como gênero artístico. Se a régua penal passa a ser aplicada sobre o conteúdo humorístico, corremos o risco de censurar toda forma de arte provocadora — música, teatro, literatura, cinema.
Um precedente perigoso
A decisão também escancara um problema jurídico de fundo: não há consenso claro sobre onde está o limite da liberdade de expressão artística. E quando esse limite é traçado conforme o gosto ou a sensibilidade momentânea, abre-se caminho para a arbitrariedade.
Ao condenar um comediante por piadas — por mais infelizes que possam parecer a alguns — o Judiciário transforma o gosto pessoal em régua jurídica. E isso coloca em xeque a própria democracia, cujo alicerce é a pluralidade de ideias e expressões, inclusive (e especialmente) as que incomodam.
Advocacia predatória não é o que incomoda o sistema. É o que o destrói por dentro.
Artigos junho 04, 2025Muito se fala em “advocacia predatória” hoje em dia. Mas pouco se aprofunda.
Advocacia predatória não é o excesso de recursos, nem o habeas corpus impetrado com ousadia, nem o advogado que bate de frente com o Judiciário.
Isso tudo pode incomodar, sim. Mas é parte da luta por direitos num sistema que, muitas vezes, se fecha para ouvir.
O que se chama de advocacia predatória, em sua essência, é uma distorção perversa da atividade jurídica. É a atuação baseada em:
- Ações padronizadas em massa, sem individualização dos fatos ou das partes;
- Processos propositadamente sem mérito jurídico, ajuizados apenas para pressionar acordos;
- Uso sistemático do Judiciário como indústria de lucro, transformando pessoas em números e o direito em mercadoria;
- Fraudes e má-fé, em que o cliente muitas vezes nem sabe que seu nome está vinculado a um processo.
É um modelo empresarial que instrumentaliza a Justiça como linha de produção. É produtivismo jurídico descolado da ética.
Mas precisamos fazer uma advertência:
⚠️ Há uma linha tênue entre o combate à advocacia predatória e o silenciamento da advocacia combativa.
Tem quem se esconda atrás do termo “predatória” para deslegitimar o advogado que questiona o sistema, que denuncia arbitrariedades, que entra com habeas corpus desconcertantes, que recorre contra decisões injustas.
Esses não são predatórios. São necessários.
A verdadeira advocacia predatória não desafia o sistema — ela se aproveita dele.
Ela não busca justiça — ela busca repetição e lucro.
Ela não confronta — ela consome.
⚖️ E o problema maior: quando a advocacia vira só repetição, o Judiciário responde com a mesma moeda — vira só máquina.
O Direito perde humanidade.
O advogado vira despachante.
O cliente, um número.
Por isso, é preciso ética e coragem para diferenciar o advogado que atua com paixão e estratégia daquele que explora o sistema como negócio impessoal.
E também é preciso vigilância, para que o discurso contra a advocacia predatória não se torne uma mordaça disfarçada.
Quando a vítima procura o agressor, ainda há crime por violação de medida protetiva?
Artigos maio 28, 2025📜 Quando a vítima procura o agressor, ainda há crime por violação de medida protetiva?
A Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006) representa um importante avanço na proteção das mulheres em situação de violência. Entre os mecanismos de proteção previstos, estão as medidas protetivas de urgência, que podem impor ao agressor o afastamento do lar, a proibição de aproximação ou de contato com a vítima. O descumprimento dessas medidas é considerado crime, previsto no artigo 24-A da mesma lei, com pena de detenção de 3 meses a 2 anos.
Vivemos em uma sociedade que, diante do medo e da insegurança, clama por punição. E punir, sim, faz parte do papel do Estado. Uma sociedade sem resposta penal diante de crimes graves gera desordem, injustiça e sofrimento.
Mas aqui está o ponto central: punir não é resolver.
Punir a qualquer custo, de forma desordenada e irracional, não resolve o problema — porque o crime, muitas vezes, não é a causa, mas o sintoma.
O sintoma de um sistema de justiça criminal falho, que prende muito, mas prende mal. Que castiga sem reeducar. Que marginaliza sem reintegrar. Que fecha os olhos para as raízes sociais, econômicas e psicológicas que alimentam a criminalidade.
Enquanto continuarmos acreditando que mais penas, mais prisões e mais repressão são as únicas respostas, vamos enxugar gelo. Vamos manter intacta a estrutura que fabrica desigualdade, exclusão e reincidência.
Punir direito significa ter um sistema que selecione o que realmente precisa de punição severa, que saiba diferenciar quem precisa ser afastado da sociedade de quem precisa de alternativas penais.
Significa garantir julgamento justo, processo legal, respeito à dignidade humana. Significa enxergar a pena como último recurso, não como política de governo.
O problema não é que o Brasil pune pouco. O problema é que pune mal.
E enquanto não olharmos para isso, vamos continuar enxergando a criminalidade apenas como um inimigo externo — quando, na verdade, ela também é um reflexo das nossas escolhas como sociedade.
Muito se fala hoje sobre o avanço da inteligência artificial no mundo jurídico. Alguns operadores do Direito veem na IA uma ameaça: será que ela vai roubar espaço de advogados, juízes, promotores? Será que vai substituir o trabalho humano?
A verdade é que a IA não é, por si só, o problema. O problema está no mau uso que alguns fazem dela.
Quando usada sem critério, a IA pode gerar erros grotescos: decisões automáticas, pareceres sem reflexão, petições genéricas e até riscos para direitos fundamentais. Há quem já queira automatizar etapas essenciais do processo judicial — inclusive decisões — como se a máquina pudesse captar as nuances da vida humana. Isso é perigoso.
Mas a IA não vai roubar o espaço de quem entende o próprio valor.
O bom advogado, a boa advogada, o juiz atento, o promotor criterioso, todos têm algo que a IA não tem: julgamento humano, ética, empatia e senso de justiça. A IA pode ajudar a pesquisar, organizar dados, otimizar tarefas — mas ela não substitui o olhar humano sobre o caso concreto.
Na prática, quem souber usar a inteligência artificial como ferramenta, e não como substituta, sairá na frente. Não se trata de competir com a IA, mas de aprender a integrá-la de forma inteligente e responsável.
O Direito lida com pessoas, vidas, histórias. E nenhum algoritmo — por mais avançado — será capaz de carregar sozinho esse peso.
Em 8 de janeiro de 2023, durante os atos antidemocráticos em Brasília, Débora Rodrigues dos Santos, cabeleireira de 37 anos, pichou com batom vermelho a frase “Perdeu, mané” na estátua A Justiça, em frente ao Supremo Tribunal Federal (STF).
Em março de 2025, o ministro Alexandre de Moraes votou por condená-la a 14 anos de prisão, considerando-a culpada por cinco crimes: tentativa de golpe de Estado, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, dano qualificado, deterioração de patrimônio tombado e associação criminosa armada.
O julgamento na Primeira Turma do STF revelou uma divergência impressionante:
- Alexandre de Moraes, Flávio Dino e Cármen Lúcia votaram por 14 anos de prisão;
- Cristiano Zanin sugeriu 11 anos;
- Luiz Fux propôs 1 ano e 6 meses, apenas pelo crime de deterioração de patrimônio tombado.
Essa diferença de votos, que vai de 1 ano e meio a 14 anos, evidencia uma insegurança jurídica preocupante e a ausência de critérios objetivos claros na aplicação das penas.
Mais grave ainda: Débora não participou de qualquer articulação golpista, não promoveu violência, não organizou invasão, não armou-se nem contribuiu para os atos de maior gravidade daquele dia. Não há dolo, não há vontade direcionada à tentativa de golpe, nem conduta ou contribuição dela para os crimes mais graves imputados. Seu ato — ainda que reprovável — se limitou a riscar uma estátua com batom.
A defesa argumenta justamente isso: não se pode atribuir a ela penas por crimes nos quais não teve nenhuma participação efetiva ou intencional, sendo, no máximo, cabível a responsabilização por deterioração de patrimônio.
Esse caso levanta questões urgentes sobre proporcionalidade, justiça e o papel do Judiciário em diferenciar responsabilidades individuais. Punir quem cometeu crimes? Sim. Mas punir com justiça. Sem transformar o sistema penal em um instrumento de desproporção que fere princípios fundamentais.
O silêncio que o CNJ quer impor aos advogados
A frase é da música "Minha Alma", do Rappa, mas poderia muito bem estar esculpida na entrada de qualquer fórum do país:
“Paz sem voz não é paz. É medo”.
O que está em jogo hoje não é só uma mudança de rito processual. O que o CNJ propõe ao querer substituir a sustentação oral por vídeos gravados é, na prática, um ataque silencioso à alma da advocacia. E quando se cala a voz da defesa, o que se instala não é justiça — é medo institucionalizado.
Sustentação oral não é ensaio gravado
A proposta do CNJ de padronizar a sustentação oral em formato de vídeo gravado parece, à primeira vista, uma solução moderna, prática, digital. Mas há uma diferença abissal entre falar com um desembargador presente — olhos nos olhos — e gravar um vídeo genérico para ser ignorado entre uma audiência e outra.
Sustentação oral é embate vivo. É timing. É reação a uma manifestação oral do Ministério Público. É leitura de feição, percepção de hesitação, mudança de rota. Não é roteiro. Não é gravação.
Um vídeo gravado é uma fala congelada no tempo, que ignora a dinâmica real da audiência. E mais: quem garante que será ouvido com a devida atenção? Quem nos assegura que, do outro lado da tela, haverá escuta e não apenas um clique para acelerar a reprodução?
Silenciar a advocacia é calar a Constituição
A advocacia é função essencial à administração da justiça — artigo 133 da Constituição. E essencial significa indispensável, não opcional. Advogado não é enfeite processual. É parte viva do contraditório. Quando o CNJ tenta transformar a sustentação oral em um link de vídeo, ele não está apenas inovando: está silenciando. E silenciar é violar.
A proposta ignora o valor da oralidade, do convencimento construído ao vivo. Um sistema que se propõe democrático não pode temer a voz de quem defende. O Judiciário não pode ser um tribunal de decisões prontas, blindado contra a palavra do advogado.
"Vídeo gravado não é sustentação oral"
A campanha da OAB/RS diz tudo em uma frase. Porque não é mesmo. Vídeo é memória digital. Sustentação é ato presente. Gravar um vídeo não substitui o momento em que a banca ouve, mesmo que por poucos minutos, o argumento humano, o apelo técnico, a última tentativa de virar o jogo.
O problema não é só jurídico. É simbólico. A gravação fria é o sintoma de um Judiciário que se fecha em si mesmo, que não quer ser incomodado, que transforma o processo em mera formalidade. E quando isso acontece, a paz que se proclama é, na verdade, medo. Medo da divergência, medo do confronto, medo do incômodo que a advocacia representa.
Não existe justiça sem voz. Não existe paz onde há silenciamento. Se a sustentação oral for substituída por vídeos gravados, o que resta é um Judiciário surdo, onde a defesa fala sozinha para uma tela e a sentença já foi digitada antes mesmo do play.
Como dizia o Rappa:
“Paz sem voz não é paz. É medo.”
E o medo não pode ser o alicerce da Justiça.
O Tribunal do Júri é um dos pilares da democracia no processo penal. Ele coloca o julgamento de crimes dolosos contra a vida nas mãos do povo — e isso é grandioso.
É a sociedade julgando, não um juiz togado isolado em sua rotina. É o povo decidindo se um cidadão será privado de sua liberdade em nome da justiça.
Mas mesmo as instituições mais nobres podem — e devem — evoluir. E no caso do Júri brasileiro, há uma regra que precisa urgentemente ser repensada: a possibilidade de condenar com apenas 4 votos entre 7 jurados.
Democracia sim, mas com segurança jurídica
O Júri é um espaço onde sete jurados, sorteados da comunidade, votam secretamente para decidir se o réu é culpado ou inocente. E, hoje, basta que quatro desses jurados entendam que o réu é culpado para que ele seja condenado.
Quatro votos. 56% de “certeza” para tirar a liberdade de alguém.
A pergunta que precisamos fazer é simples: é aceitável privar uma pessoa da liberdade com 44% de dúvida?
A dúvida não pode condenar
A dúvida, no Direito Penal, deve ser um freio, não um acelerador. O princípio do in dubio pro reo é uma garantia fundamental: na dúvida, decide-se pela liberdade.
Mas o modelo atual do Júri relativiza esse princípio. Ao permitir a condenação com a mínima simples (4 a 3), ele admite que não é necessário ter convicção unânime, ou mesmo ampla, para tirar alguém da sociedade.
É claro que há crimes graves, provas contundentes e jurados firmes. Mas o problema não é o caso concreto: é a regra geral.
Nos Estados Unidos, a condenação exige unanimidade
Nos EUA, onde o Júri também é um instrumento importante da justiça penal, a condenação só ocorre se todos os jurados votarem pela culpa. Um único voto pela dúvida já impede a prisão.
Eles entenderam algo essencial: a liberdade não pode ser retirada com base em dúvida significativa. E, se o Brasil quer fortalecer seu Júri, precisa considerar esse caminho.
Não se trata de enfraquecer o Júri — mas de fortalecê-lo
A crítica aqui não é ao Júri. Ao contrário: o Júri é uma conquista popular. É um símbolo da confiança na capacidade do povo de julgar. É democrático, humano e direto.
Mas uma instituição democrática precisa estar à altura do valor que ela protege: a liberdade.
Exigir 5 votos para condenar — ou até a unanimidade — não seria enfraquecer o Júri. Seria garantir que ele seja ainda mais justo.
O Tribunal do Júri precisa continuar existindo. E precisa ser defendido como espaço legítimo de julgamento popular.
Mas ele também precisa ser reformado onde ainda é vulnerável. Porque condenar alguém com 56% de certeza é abrir margem para injustiças.
Mais votos para condenar significam mais segurança, mais responsabilidade, mais justiça. E se a justiça é feita em nome do povo, ela precisa representar o que o povo espera: decisões responsáveis, firmes, mas sempre baseadas na certeza — não na dúvida.
No tribunal da vida real, as palavras têm peso. E no processo penal, elas podem valer mais do que deveriam. Há um fenômeno tão grave quanto negligenciado no sistema de justiça criminal brasileiro: decisões judiciais que mandam réus a julgamento pelo Tribunal do Júri com base em depoimentos frágeis — pior, baseados no famigerado "ouvi dizer".
Você já parou para pensar que alguém pode ser submetido a um julgamento popular — onde há possibilidade real de ser condenado a décadas de prisão — porque uma testemunha disse que ouviu de alguém que foi o acusado quem cometeu o crime?
Sim. Isso acontece. E mais do que deveria.
O eco das ruas dentro do Fórum
O chamado testemunho de “ouvir dizer” (ou testemunho indireto) é aquele em que a pessoa não presenciou o fato, mas apenas repete o que outra pessoa lhe contou. Ele não tem valor probatório robusto. No entanto, muitos juízes, na fase de pronúncia — aquela que decide se o réu vai ou não a julgamento pelo júri — aceitam esse tipo de “prova” como suficiente.
É como se a voz da rua valesse mais que o silêncio da prova técnica.
Essa prática desafia diretamente a lógica do sistema penal. Afinal, quem vai ao Tribunal do Júri deveria estar lá porque há indícios suficientes de autoria e materialidade, não porque “fulano falou que ouviu sicrano dizendo”.
Pronúncia não é condenação — Mas machuca como se fosse
Alguns juízes justificam: “A pronúncia não é uma sentença condenatória, é apenas um juízo de admissibilidade”. Verdade. Mas não nos enganemos: ser pronunciado já coloca o réu no corredor da infâmia.
Ele será levado a julgamento popular, diante de leigos — cidadãos comuns, influenciáveis pelo apelo emocional, pelo clamor público e, muitas vezes, pelo preconceito social. Basta um erro na condução da acusação ou uma narrativa convincente, ainda que sem base fática sólida, para destruir uma vida.
O que diz a jurisprudência?
O Superior Tribunal de Justiça já se manifestou inúmeras vezes no sentido de que testemunhos indiretos não podem fundamentar condenações, salvo se corroborados por outros elementos de prova. Mas, estranhamente, quando o assunto é a pronúncia, o rigor afrouxa. E é aí que mora o perigo.
A Constituição Federal de 1988 garante a todos o direito ao devido processo legal, à ampla defesa e ao contraditório. Como conciliar isso com decisões baseadas em relatos de terceiros, não confirmados, não analisados com seriedade, e, pior, não presenciados?
A voz do acusador ecoando mais alto que a lógica
Não raro, os próprios promotores utilizam esse tipo de testemunho para preencher lacunas probatórias gritantes. E, em vez de serem rechaçados de pronto, encontram eco em decisões judiciais que deveriam prezar pela seriedade da acusação.
O processo penal é um espaço técnico. E a técnica deve impedir que a emoção, o senso comum ou a vontade de “dar uma resposta à sociedade” passem por cima de garantias fundamentais. Testemunho de “ouvi dizer” é ruído. E ruído não pode condenar.
A pronúncia é uma decisão grave. Ela deve ser fundada em elementos concretos, não em boatos reciclados por terceiros. Quando o Judiciário admite esse tipo de "prova", contribui para um sistema em que a vida e a liberdade de alguém podem ser decididas com base em meras suposições — ou, pior, em fofocas.
Não se trata de proteger culpados. Trata-se de garantir que apenas os verdadeiros responsáveis enfrentem o julgamento, e que isso ocorra sob bases sólidas, não sobre o pântano dos “ouvi dizer”.
No Direito Penal, a dúvida deveria proteger. Mas quando se condena com base em ecos, o que se ergue não é justiça. É ruína.
No Direito Penal, a dúvida deveria ser um sinal de alerta, um freio para evitar injustiças. Mas o que acontece quando aqueles que deveriam ser guardiões da justiça decidem ignorá-la? A frase da música "Somos Quem Podemos Ser", de Humberto Gessinger, traz uma provocação forte:
"Quem ocupa o trono tem culpa, quem oculta o crime também, quem duvida da vida tem culpa, quem evita a dúvida também tem".
No sistema penal, muitos juízes não apenas evitam a dúvida – eles a eliminam sem a certeza necessária. E fazem isso em nome de uma suposta “eficácia” da justiça criminal, mesmo quando essa eficácia significa condenar sem provas concretas.
A condenação baseada na conveniência
O princípio do in dubio pro reo, pedra fundamental do processo penal, determina que, diante da dúvida, deve-se decidir a favor do réu. No entanto, a realidade mostra que, muitas vezes, esse princípio é deixado de lado. O que se vê é a inversão do ônus da prova: não cabe mais ao Ministério Público provar a culpa, mas ao réu demonstrar sua inocência. E quando isso acontece, o sistema deixa de ser um meio de garantir justiça para se tornar um instrumento de punição a qualquer custo.
É comum encontrarmos sentenças condenatórias em que o juiz afirma algo como: “Não há prova cabal da autoria, mas a versão do réu não convence”. Ora, se não há prova cabal, como pode haver condenação? Quando a dúvida é ignorada, o Tribunal se torna um palco de arbitrariedade.
O medo de parecer “garantista”
Muitos juízes evitam absolver, mesmo diante de provas frágeis, por medo da repercussão. Afinal, vivemos em tempos em que garantir direitos fundamentais virou sinônimo de impunidade. O magistrado que decide pela absolvição muitas vezes se torna alvo de críticas da sociedade, da imprensa e até de seus pares. O resultado? Sentenças que condenam por presunção, não por certeza.
E é aí que voltamos à provocação da música: quem evita a dúvida também tem culpa. O juiz que condena mesmo sabendo que a prova não é suficiente contribui para um sistema que pune sem critério e perpetua injustiças. A dúvida, quando existe, deve ser levada a sério, pois uma única condenação indevida já é suficiente para destruir uma vida.
Talvez o ponto mais alarmante dessa distorção esteja nos processos criminais onde a ausência de provas se torna, paradoxalmente, um argumento de condenação. Como? Simples: ao invés de reconhecer que não há elementos suficientes para um juízo de certeza, alguns magistrados usam a fragilidade da prova para justificar a culpa.
Tomemos como exemplo casos de tráfico de drogas. Não raras vezes, o réu é preso com uma quantidade pequena de entorpecentes, sem qualquer outra prova de que comercializava a substância. O correto seria a aplicação do artigo 28 da Lei de Drogas (uso pessoal). Mas, diante da dúvida, muitos juízes condenam pelo artigo 33, sob justificativas como: “A quantidade é pequena, mas o local e as circunstâncias indicam tráfico.” Ou seja, o réu já entra no tribunal pré-condenado, e a falta de provas vira uma peça de acusação.
O mesmo ocorre em casos de reconhecimento fotográfico duvidoso, onde a única “prova” da culpa do réu é uma fotografia mostrada à vítima em um ambiente completamente sugestionado. Apesar de inúmeras decisões superiores apontando a fragilidade desse método, ainda há juízes que preferem condenar com base nessa evidência precária do que enfrentar a dúvida e absolver.
O juiz que evita a dúvida, em vez de enfrentá-la, se torna um agente da injustiça. Se o direito penal deve ser o último recurso do Estado, ele não pode ser guiado por suposições ou por um medo irracional da absolvição. O peso de uma condenação errada é infinitamente maior do que o de uma absolvição justa.
A dúvida não é um problema no processo penal – ela é uma proteção. Quem evita a dúvida também tem culpa, porque abre mão do próprio sentido da Justiça. E, quando a Justiça se torna um tribunal de certezas forjadas, não são apenas os réus que perdem. É toda a sociedade.
O uso do termo "Doutor" para advogados é uma prática tradicional no Brasil, mas nem sempre bem compreendida. Muitas pessoas associam o título exclusivamente a quem possui um doutorado acadêmico, mas no contexto jurídico, seu uso tem raízes históricas e culturais que justificam sua adoção.
Origem histórica do título de Doutor para advogados
O costume de chamar advogados de "Doutor" remonta à tradição portuguesa. No período colonial, os bacharéis em Direito formados na Universidade de Coimbra, em Portugal, tinham grande prestígio na sociedade e eram automaticamente tratados como "Doutores" ao regressarem ao Brasil. Esse hábito se manteve mesmo após a criação dos primeiros cursos jurídicos no país, em 1827, nas faculdades de Olinda e São Paulo.
A justificativa para essa titulação vinha da importância do Direito na organização do Estado e da sociedade, bem como do grau de conhecimento exigido para o exercício da advocacia. Com o tempo, a tradição se consolidou, e o tratamento passou a ser amplamente adotado, independentemente da obtenção de um doutorado acadêmico.
Base jurídica e normatividade
O tratamento de "Doutor" para advogados não decorre de uma exigência acadêmica, mas sim de uma convenção social e de normas institucionais. Embora a legislação brasileira não imponha o tratamento, o próprio Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) reconhece essa tradição e permite o uso pelos advogados inscritos nos seus quadros.
No Brasil, o costume foi reforçado por normas que regulam a atuação de profissionais do Direito. Além disso, em ambientes forenses, como tribunais e audiências, é comum que juízes, promotores e demais operadores do Direito se tratem por "Doutor" como sinal de respeito e formalidade.
Doutorado acadêmico x Título honorífico
É importante diferenciar o título de "Doutor" concedido a advogados do título acadêmico de doutorado. No meio acadêmico, o doutorado é um grau concedido após a defesa de uma tese original e aprofundada sobre determinado tema, após anos de estudo e pesquisa. Já o título honorífico usado por advogados no Brasil é uma prática convencional, baseada em um reconhecimento histórico e profissional.
Outras categorias profissionais, como médicos e delegados de polícia, também recebem o tratamento de "Doutor" sem necessariamente possuírem um doutorado acadêmico. A tradição se mantém viva principalmente no meio jurídico e forense, onde a formalidade do tratamento contribui para a solenidade dos atos processuais.
O uso de "Doutor" para advogados é uma tradição profundamente enraizada na cultura jurídica brasileira. Embora não seja um reconhecimento acadêmico, a titulação carrega um simbolismo que remete à importância do Direito e da advocacia na sociedade. Mais do que uma questão formal, trata-se de um costume que r eforça o prestígio da profissão e a relevância do advogado no sistema de Justiça.
No Direito Penal, um dos debates mais importantes gira em torno de como e por que alguém deve ser punido. Para entender essa questão, é essencial diferenciar Direito Penal do Fato e Direito Penal do Autor, duas abordagens que influenciam diretamente a aplicação da justiça.
Neste texto, vamos explicar de forma clara e didática o que cada uma dessas concepções significa, suas diferenças e os riscos de uma aplicação equivocada do Direito Penal do Autor.
O Que é o Direito Penal do Fato?
O Direito Penal do Fato é a base dos sistemas penais modernos e democráticos. Ele estabelece que ninguém pode ser punido por sua personalidade, histórico de vida ou características pessoais, mas apenas por um fato criminoso que tenha cometido.
Ou seja, a pena deve estar relacionada ao crime cometido, e não à identidade do agente.
Princípios Fundamentais do Direito Penal do Fato:
✅ Legalidade – A pessoa só pode ser punida se houver uma lei que defina aquele ato como crime.
✅ Culpabilidade – A punição exige que o indivíduo tenha agido com dolo ou culpa.
✅ Proporcionalidade – A pena deve ser justa e equilibrada em relação à gravidade do crime.
✅ Presunção de Inocência – O Estado deve provar a culpa do réu; o acusado não precisa provar sua inocência.
Exemplo: Se alguém for julgado por furto, o juiz deve decidir com base nas provas do crime. Não importa se o réu tem uma aparência humilde, se já cometeu outros delitos ou se tem um "jeito suspeito". O que importa é se ele furtou ou não.
O Direito Penal do Fato protege os cidadãos contra condenações baseadas em preconceitos ou julgamentos subjetivos.
O Que é o Direito Penal do Autor?
O Direito Penal do Autor, por outro lado, foca na identidade da pessoa e não no crime cometido. Nele, um indivíduo pode ser punido não apenas pelo que fez, mas por quem ele é.
Essa lógica esteve presente em regimes autoritários, como o nazismo, onde pessoas eram punidas simplesmente por pertencerem a determinados grupos.
Características do Direito Penal do Autor:
❌ A pena não se baseia no fato, mas na pessoa – O indivíduo é punido por seu caráter, estilo de vida ou passado.
❌ Uso de antecedentes criminais como justificativa – O histórico do réu pesa mais que as provas do crime atual.
❌ Perda da presunção de inocência – O réu precisa provar que é inocente, em vez de o Estado provar sua culpa.
Exemplo: Um juiz condena um réu por roubo sem provas suficientes, apenas porque ele "parece um criminoso" ou porque "já esteve preso antes".
Isso é Direito Penal do Autor, pois não há prova concreta do fato criminoso, mas uma condenação baseada na vida pregressa da pessoa.
O Perigo do Direito Penal do Autor na Justiça
Embora a Constituição Federal e os princípios do Direito Penal garantam que ninguém pode ser punido sem provas de um crime, na prática, muitas decisões judiciais ainda são influenciadas pelo Direito Penal do Autor.
Isso acontece quando juízes e promotores fundamentam suas decisões mais na história de vida do réu do que nas provas concretas do caso.
Exemplo: Muitas sentenças condenam pessoas apenas porque "não provaram sua inocência", invertendo o ônus da prova. No Brasil, o Ministério Público tem a obrigação de provar a culpa do réu, e não o contrário.
Se um juiz afirma que "o réu não demonstrou que era inocente", ele está aplicando Direito Penal do Autor, violando o princípio da presunção de inocência.
A diferença entre Direito Penal do Fato e Direito Penal do Autor é essencial para garantir um sistema de justiça justo.
✅ O Direito Penal do Fato respeita a legalidade e a presunção de inocência, punindo as pessoas com base em provas de um crime.
❌ O Direito Penal do Autor leva a condenações injustas, pois pune indivíduos com base em seu passado ou personalidade, e não pelos atos que cometeram.
Embora o Direito Penal do Fato seja a base do nosso sistema jurídico, o Direito Penal do Autor ainda se manifesta em muitas decisões judiciais. Por isso, advogados, juízes e estudantes de direito devem estar atentos para combater esse problema e garantir um julgamento justo para todos.
Ted Bundy no Tribunal: Estratégias Jurídicas e a Autopromoção de um Serial Killer
Artigos janeiro 20, 2025Theodore Robert Bundy, conhecido mundialmente como Ted Bundy, não apenas chocou os Estados Unidos pelos seus assassinatos brutais, mas também pelo modo como se comportou nos tribunais. Entre 1974 e 1978, Bundy foi responsável pela morte de pelo menos 30 mulheres jovens, embora o número real de vítimas possa ser muito maior. Sua própria representação legal em seus julgamentos tornou-se um dos elementos mais fascinantes e bizarros de sua história criminosa.
A Jornada Criminosa de Ted Bundy
Ted Bundy começou sua série de crimes em 1974, atacando mulheres jovens em estados como Washington, Oregon, Utah e Colorado. Ele era conhecido por seu charme, boa aparência e capacidade de manipulação, características que usava para atrair suas vítimas. Em 1975, ele foi preso pela primeira vez em Utah por portar ferramentas de roubo. Durante a investigação, ligaram Bundy a diversos desaparecimentos e assassinatos.
A Representação de Si Mesmo no Tribunal
O julgamento de Bundy em 1979, pelo sequestro e assassinato de duas mulheres na Universidade Estadual da Flórida, é considerado um dos mais sensacionais da história americana. Bundy optou por se defender sozinho, recusando a assistência de advogados experientes. Apesar de sua falta de formação jurídica, ele tinha experiência acadêmica em psicologia e direito, o que lhe deu confiança para enfrentar os tribunais.
Bundy usou a oportunidade para transformar o julgamento em um espetáculo. Ele frequentemente fazia perguntas rebuscadas a testemunhas, interagia diretamente com o juiz e se aproveitava do grande número de jornalistas presentes. Bundy chegou a pedir a mão de sua namorada, Carole Ann Boone, durante o julgamento – um ato que surpreendeu e intrigou o público.
Estratégias de Manipulação
Bundy usava o tribunal como uma plataforma para manipular a opinião pública. Ele sabia que sua boa aparência e charme poderiam conquistar simpatizantes, inclusive entre os jurados. Durante os procedimentos, Bundy frequentemente fazia questão de parecer confiante e em controle da situação, criando a ilusão de que era uma vítima de um sistema judicial injusto.
No entanto, suas táticas também incluíam atos de desespero. Bundy fugiu duas vezes da prisão – uma em 1977, no Colorado, e outra em 1978, na Flórida. Durante sua segunda fuga, ele cometeu o infame massacre na casa da irmandade Chi Omega e assassinou mais três mulheres antes de ser recapturado.
O Veredicto e as Consequências
O julgamento terminou com a condenação de Bundy por assassinato em 24 de julho de 1979. Ele foi sentenciado à pena de morte por eletrocussão. Durante seus anos no corredor da morte, Bundy continuou a manipular as autoridades, confessando gradualmente mais crimes na tentativa de adiar sua execução. Apesar disso, ele foi executado em 24 de janeiro de 1989.
Reflexões sobre o Caso
Ted Bundy não foi apenas um assassino em série; ele também foi um mestre na manipulação do sistema judicial. Seu caso revelou várias vulnerabilidades no sistema legal dos Estados Unidos na época, incluindo:
- Permissividade do Tribunal: Bundy foi autorizado a se representar, mesmo sem a formação adequada, transformando o julgamento em um circo midiático.
- Segurança Prisional Frágil: Suas fugas expuseram falhas graves na segurança das prisões.7
- Uso de Mídia: O caso Bundy foi um dos primeiros a ser amplamente coberto pela televisão, destacando o impacto da opinião pública em julgamentos de alto perfil.
Ted Bundy não apenas cometeu crimes hediondos, mas também utilizou o sistema judicial como palco para sua autopromoção. Seu julgamento deixou lições importantes sobre a necessidade de equilibrar direitos constitucionais com a eficácia da Justiça. Embora seu charme tenha enganado muitos, sua captura e condenação final mostraram que, mesmo os mais manipuladores, eventualmente enfrentam as consequências de seus atos.
Você achou esse texto interessante? Então você pode gostar destes livros:
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Referências:
Rule, Ann. The Stranger Beside Me. W. W. Norton & Company, 1980.
"Ted Bundy Trial: 1979." Famous Trials, University of Missouri-Kansas City School of Law.
Tribunal de Miami-Dade. Processo Criminal nº 79-3456, 1979.
Jeffrey Dahmer: Como as Brechas no Sistema Permitiram que Ele Continuasse Matando
Artigos janeiro 13, 2025Jeffrey Dahmer, também conhecido com o "Canibal de Milwaukee", é um dos assassinos em série mais notórios da história moderna. Entre 1978 e 1991, Dahmer matou 17 homens e adolescentes, envolvendo-se em atos de necrofilia e cnibalismo. Apesar do caráter brutal de seus crimes, sua própria captura e a continuidade de sua atividade criminosa revelam falhas gritantes no sistema de justiça e na sociedade como um todo. Este artigo analisa como essas brechas permitiram que Dahmer escapasse da Justiça por tanto tempo.
Os Primeiros Sinais e o Descaso da Sociedade
Em 1978, Jeffrey Dahmer cometeu seu primeiro assassinato aos 18 anos. Ele matou Steven Hicks, um jovem de 19 anos, e escondeu seu corpo. Apesar de suspeitas em relação ao comportamento de Dahmer, ele não foi investigado. Esse padrão de comportamento – de comissão de crimes seguidos por negligência – se repetiu ao longo dos anos. Sua mudança para Milwaukee marcou o início de uma série de assassinatos brutais que permaneceram invisíveis aos olhos das autoridades.
As Brechas na Atuação Policial
O caso mais emblemático de negligência policial ocorreu em maio de 1991, quando Konerak Sinthasomphone, um adolescente de 14 anos, conseguiu escapar do apartamento de Dahmer. Ele foi encontrado nu e desorientado na rua, mas Dahmer convenceu os policiais de que o jovem era seu amante maior de idade e que estavam apenas discutindo. Apesar das circunstâncias suspeitas e dos apelos de testemunhas, os policiais devolveram Sinthasomphone a Dahmer, que posteriormente o assassinou. Essa falha ilustra o preconceito e a homofobia que prejudicaram a capacidade das autoridades de investigar adequadamente o caso.
A Manipulação do Sistema
Jeffrey Dahmer também demonstrou uma capacidade notável de manipular o sistema judicial. Em 1988, ele foi condenado por molestar um jovem de 13 anos, mas recebeu uma sentença leve de um ano de regime semiaberto, permitindo-lhe trabalhar durante o dia. Durante esse período, Dahmer continuou a matar, utilizando sua aparente normalidade como uma fachada para esconder seus crimes. A incapacidade do sistema de tratar adequadamente um comportamento tão perturbador foi crucial para o prolongamento de seus atos.
A Captura e o Impacto do Caso
Dahmer foi finalmente preso em 22 de julho de 1991, quando Tracy Edwards, uma de suas vítimas em potencial, conseguiu escapar e chamar a polícia. No apartamento de Dahmer, foram encontradas fotografias de corpos desmembrados, restos humanos e evidências de canibalismo. Ele foi condenado a 16 prisões perpétuas em 1992 e foi morto na prisão por um companheiro de cela em 1994.
Reflexões sobre as Brechas do Sistema
O caso de Jeffrey Dahmer evidenciou várias deficiências do sistema de justiça criminal:
- Negligência Policial: A homofobia e o preconceito contribuíram para a falta de investigação em situações suspeitas.
- Sentenças Leves: Condenações brandas para crimes graves demonstraram a subestimação de comportamentos perigosos.
- Falta de Integração Comunitária: A comunidade não foi ouvida adequadamente, apesar das repetidas denúncias e suspeitas em relação a Dahmer.
A história de Jeffrey Dahmer é um lembrete sombrio de como as falhas no sistema de justiça podem ter consequências devastadoras. Casos como esse reforçam a necessidade de policiamento eficiente, responsável e livre de preconceitos, além de um sistema judicial que priorize a segurança e o bem-estar da sociedade.
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Referências:
Masters, Brian. The Shrine of Jeffrey Dahmer. Hodder & Stoughton, 1993.
Schwartz, John. "When Police Ignored a Cry for Help." The New York Times, 26 de julho de 1991.
Tribunal de Milwaukee. Processo Criminal nº 91CF2837, 1992.