Violação das prerrogativas dos advogados: um crime que precisa ser respeitado

outubro 22, 2025


A violação das prerrogativas dos advogados é crime, mas ainda precisa ser tratada como tal. Antes de tudo, é preciso explicar o que são essas prerrogativas, porque muita gente ainda acha que se trata de privilégio de advogado, quando, na verdade, são garantias fundamentais para que o direito de defesa exista de forma concreta.

As prerrogativas estão previstas no Estatuto da Advocacia (Lei 8.906/94) e asseguram que o advogado possa atuar com liberdade, independência e sem medo de retaliações. Acesso aos autos, comunicação reservada com clientes presos, inviolabilidade do escritório, não ser impedido ou constrangido por autoridade — tudo isso não é benefício pessoal, mas condição mínima para que o cidadão tenha uma defesa efetiva diante do Estado.

Até poucos anos atrás, violar essas garantias era tratado como mero desrespeito administrativo. Foi somente com a Lei 13.869/2019, a Lei de Abuso de Autoridade, que surgiu pela primeira vez um tipo penal específico para punir quem impede o exercício da advocacia.

Esse dispositivo incluiu o artigo 7º-B no Estatuto, mas com pena branda, que ia de três meses a um ano de detenção. Na prática, quase simbólico. Só que esse cenário mudou com a Lei 14.365/2022, que atualizou o dispositivo e aumentou a pena para detenção de dois a quatro anos, além de multa. Ou seja, hoje, violar prerrogativa é crime com pena mais alta que muitos delitos que lotam os fóruns pelo Brasil. 

A lei existe, é clara e está em vigor.

O problema é que, apesar desse avanço legislativo, a aplicação prática ainda engatinha. A lei é nova e enfrenta resistência justamente porque sua efetividade exige algo que parte das autoridades não está acostumada a fazer: responsabilizar outras autoridades. Em muitos casos, para punir a violação de prerrogativas, seria necessário que um delegado investigasse outro delegado, que um promotor denunciasse outro promotor, que um juiz reconhecesse o abuso praticado por alguém do próprio sistema. Isso não é confortável, e por enquanto ainda prevalece a cultura da condescendência institucional. Por isso, mesmo diante de flagrantes desrespeitos à atuação do advogado, os casos raramente resultam em responsabilização criminal.

Mas a tendência é que esse quadro evolua com o tempo. À medida que a advocacia se posiciona, que a sociedade entende que prerrogativa não é vaidade de advogado, e que os operadores do direito passam a enxergar essas garantias como parte do sistema de justiça, e não como capricho corporativo, a lei começará a ser aplicada com mais firmeza. A responsabilização virá, e aqueles que insistem em tratar o advogado como intruso ou obstáculo vão sentir o efeito da legislação. A lei não foi criada para enfeite. Ela existe para ser usada, e cedo ou tarde será.

Violação de prerrogativa não é inconveniente, não é excesso de autoridade, não é mal-entendido. É crime. E tratar como crime é o primeiro passo para fortalecer a advocacia, proteger o cidadão e fazer valer, de fato, o Estado de Direito.

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